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capitulo 3 Um segundo encontro
A farmácia não fica longe, mas
não quero ficar cansada, quero fazer a trilha até as cachoeiras e não quero
passar vergonha na frente dos guias. Isso seria motivo de piadas para o resto
da vida. Chego à farmácia, e enquanto a farmacêutica vai pegar os remédios que
eu pedi tiro meu telefone da bolsa para dar uma olhada rápida na internet.
Afinal, faz dois dias que eu não olho e devem ter algumas mensagens de
felicitações. Vejo as mensagens, mas não tenho tempo de responder agora, e
quando estou prestes a guardar o celular e pegar o remédio. Meu Deus! Isso será
o meu dia de sorte, ou diria de azar. É ele, o homem de ontem, fico nervosa; pago
o remédio e saiu de cabeça baixa para fingir que não o vi.
Chego ao carro e dou um suspiro
de alivio sem sequer entender porque eu estou fugindo dele. Ele nem sequer deve
lembrar que me viu ontem, mas pra não correr o risco de me sentir boba
novamente é melhor eu ir embora. Ligo o carro e vou rumo ao hotel, e ele ainda
envolta em meus pensamentos. Porque eu saí de cabeça baixa? Porque eu não disse
olá e tentei engrenar uma conversa? Porque eu saí feito uma fugitiva? Isa, Isa,
você deve estar com problemas psiquiátricos, como pôde fingir que... O barulho
interrompe meus pensamentos, uma moto, não acredito será que ele vai passar por
mim? Será que é a moto dele? Mais porque eu estou pensando isso? Milhares de
outras pessoas possuem moto sabia Adalgisa? – Sussurrei.
A dúvida chega ao fim, com
certeza é a moto dele. É o capacete dele, posso ver pelo retrovisor, e está
acelerando me ultrapassando. O quê? É impressão minha ou ele está ao meu lado
pedindo pra eu encostar o carro? Será que eu estou delirando? Mas, o que ele
quer comigo? Será que ele é um bandido? Não, acho que tive a impressão de que o
recepcionista o conhecia! Sim e que garantia isso me dá? Será que ele quer
perguntar por que eu fui tão boba ontem por não falar com ele? Ah! Não! Eu
estou sendo idiota agora! Já estou ultrapassando todos os limites imaginando mil
coisas. E não é delírio, ele continua apontando pedindo pra eu encostar o
carro. É, agora que estou em uma rua mais movimentada eu paro o carro e baixo o
vidro.
Ele encosta a moto ao meu lado, e
nem preciso dizer que o capacete sai de sua cabeça com uma lentidão digna de suspense
de hollywood, ou é minha imaginação.
- Desculpa te assustei? –Pergunta
ele.
- Um pouco. - Respondo sem
pensar.
- Desculpa! É que eu fui à
farmácia e achei seu celular.
Como pode eu sai tão apressada
com medo de ter que falar com ele que esqueci o celular e agora vou ter que
falar de um jeito ou de outro.
- Obrigado. Saí um pouco
apressada. - Falo como quem procura uma explicação.
-Olhe meu nome é Eduardo, mais
pode me chamar de Dudu, e desculpe mais uma vez se assustei você.
Ele me entrega o celular e fica
me olhando como quem espera uma resposta. Depois de alguns segundos me recupero
e crio coragem para falar, na verdade quase gaguejando.
- Adalgisa, mais pode chamar de Isa.
Ele ri. E agora eu fico sem
entender o que tornou o meu nome tão engraçado. E por alguns segundos, ou
frações de segundo, não sei por que, desde a primeira vez que o vi tenho a
sensação de que está tudo em câmera lenta, nos olhamos sem pronunciar palavra
alguma.
- Estou desculpado? – Pergunta
com um leve sorriso no canto da boca.
Ai que alivio, o silêncio foi
quebrado! Estou apavorada, com medo de ficar com aquela cara de boba que eu
fiquei ontem à noite. Junto forças, muitas forças e tento parecer descontraída.
Afinal, eu sempre fui mesmo.
- Está. Se me disser o que achou
tão engraçado. – Respondo.
- Desculpe, é que quando eu
cheguei você estava rindo.
Ele está rindo de mim, ele notou
que desde ontem eu estou sendo muito boba, e agora ele está rindo de mim. –Falo
a mim mesma.
- Imaginei mil e uma coisas
quando você fez gestos pra eu parar. Você podia ser um bandido, um maníaco. –
Disse.
Agora é a minha vez de rir. Mas,
do contrário ele ri muito mais! É uma risada tão linda, ele é lindo, e a risada,
me parece uma risada tão sincera, daquelas que há muito tempo eu não dou.
- Maníaco. - Repete ele, e ri ainda mais.
- Sei lá. Não está escrito na
testa não é? – Disse eu, sorrindo.
Rimos um pouco e ele completa:
- Você tem razão. Mas, pensando
assim você não deveria ter encostado.
- A rua não estava movimentada, por
isso não parei antes. Estava esperando mais movimentação.
- Bem, eu estou hospedado no
mesmo hotel que você, então, acho que vou acompanhando seu carro, caso algum
maníaco resolva lhe abordar. – Brincou comigo.
Depois de alguns risos mais
contidos, entro no carro e dou partida enquanto ele segue na moto. Chegamos ao
hotel e ele ainda espera que eu saia do carro pra me acompanhar, e eu estou
ficando um pouco menos ansiosa agora.
- Seu namorado está doente? -
Perguntou ele.
- Namorado? Não minha amiga. –
Respondo.
Namorado? Porque ele acha que eu
tenho namorado? E porque está interessado? Meus próprios pensamentos me
interrompem e me repreendem. Isa não delira.
- Então, seu namorado está bem? -
Continua ele se fazendo de desentendido.
- Não tenho namorado, estou de
viajem com duas amigas para comemorar meu aniversário. Respondo como se
precisasse dar uma explicação e deixar bem claro para ele que não tenho
namorado.
- Meus parabéns Adalgisa. –
Prontamente
- Obrigado. E... Isa me chame de Isa.
Ohhhhh meu Deus; ele lembra meu
nome, e está sempre engatando uma conversa e eu não consigo fazer outra coisa a
não ser responder as perguntas dele como se eu tivesse sérios problemas
mentais.
- Desculpa minha falta de
educação, quantos anos vai fazer? – Ele pergunta.
- Na verdade já fiz. 25.
- E o que vocês planejaram pra
viagem?
- Ainda não planejamos nada
especifico. Talvez trilha, ver as cachoeiras, etc.
- Eu conheço bem a cidade, talvez
possa acompanhar vocês. – O sugeriu.
E rapidamente ele completa:
- Uma mulher tão bonita, acompanhada
só por mulheres... Pode ser perigoso! Se houver algum maníaco a solta? –
Completou com ironia.
Nós rimos, e já que agora eu
estou começando a ficar um pouco menos perturbada com a beleza dele eu continuo
a conversa.
- E a sua namorada não vai ficar
chateada de você servir de guia para um grupo de mulheres que você não conhece.
– Pergunto.
- Eu não tenho namorada, e se
tivesse eu teria que terminar com ela agora mesmo. – Falou com um sorriso no
canto da boca.
O que foi isso, uma cantada? Uma loucura
minha? Tão bonita? Eu? Ele me acha bonita, o maior gato de todos os tempos me
acha bonita? E agora? O que eu respondo? Droga ficou nervosa de novo, vamos
parar logo com isso! – Pensei consigo.
- Eu já vou indo, tenho que dar o
remédio da minha amiga. Tchau.
Saída de emergência, alguém me
diz onde é, a saída de emergência! Eu sei que já me despedi, já dei as costas,
estou saindo, mas, ainda estou profundamente perturbada. Queria voltar e
perguntar se aquilo foi uma cantada. Porque se foi, já funcionou! Ao mesmo
tempo quero fugir, ele me intriga, me faz ter medo. Não sei, ele desperta em
mim alguma coisa que eu não conheço, quero correr, mais isso seria ridículo,
então sinto uma mão tocando meu pulso, em qualquer outra situação eu sentiria
medo, até uma repulsa, onde já se viu um estranho segurar meu pulso. Mas,
porque eu não sinto repulsa? Estou sentindo um calor subindo pela minha nuca, e
talvez, até uma imensa satisfação por essa mão me deter. Tá tudo confuso. Eu me
viro, olho em seus olhos e percebo que ele realmente é lindo, sem querer
percebo que meus olhos vão diretos à sua boca, e sei muito bem o que Freud
diria sobre isso.
- Você não me respondeu? -
Pergunta ele.
Alguns segundos de silêncio e sei
que preciso responder, se eu não responder vou ficar tentada mais uma vez a
desviar os olhos praqueles lábios carnudos em forma de coração.
- O quê exatamente? – Pergunto
fingindo-me de boba.
- Se me quer.
É impossível não entalar! Fico
vermelha, tremendo; sei lá como é que eu fico, mas, se a Lêle ou a Bia
estivessem aqui, isso seria motivo de piada até o final da viagem, quem sabe da
vida inteira. Graças a Deus ele percebe o que disse e continua.
- Como guia. Se você quer que eu
seja seu guia e de suas amigas.
- Acho que é melhor não. Talvez
seja melhor procurar um profissional, essas trilhas podem ser muito perigosas.
– Respondo.
- E se eu disser que eu sou o
guia? – Diz convencidamente.
- E se eu pedir pra ver seu
crachá? - Respondo sorrindo.
Ele ri e continua:
- Veja bem, eu estou viajando
sozinho, e me ofereci por que também estou precisando de companhia, se você não
quiser minha presença tudo bem, mas se puder me fazer este favor podemos chamar
um guia e sair eu você e suas amigas. – Fala com clareza.
Sinto todos os meus devaneios, agora,
escorrerem pelo ralo! Eu aqui toda nervosa e me achando, pensando que este Deus
grego, talvez, estivesse interessado por mim e na verdade ele só quer
companhia. Ainda bem que eu não estou contabilizando quantas vezes eu tenho
feito ele de bobo, desde ontem à noite quando o conheci.
- Desculpe. Desculpe minha falta
de educação. E, pode sim! pode nos acompanhar.
- Que bom, vou falar com o Josué.
Podemos nos encontrar daqui à uma hora no lago?
- Quem é Josué? – Pergunto
preocupada.
- O guia contratado pelo hotel.
- Humm. Então Tchau.
- Até daqui a pouco. – Respondo.